A LAICIDADE DO ESTADO E OS DIREITOS HUMANOS

Desde a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, na França revolucionária (1789), a independência do Estado diante de qualquer religião tem sido evocada como um requisito indispensável para a efetivação do artigo 10 desse documento, que dizia o seguinte:

“Ninguém deve ser molestado por suas opiniões, mesmo religiosas, desde que sua manifestação não perturbe a ordem pública estabelecida pela lei.”

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada pela Assembléia Geral das Nações Unidas, em 1948, contém várias referências a essa questão: no preâmbulo, proclama o advento de um mundo novo em que se goze da liberdade de crença; no artigo II afirma que os direitos e as liberdades devem ser gozados sem distinção de religião (entre outras condições), assim como, no artigo XVI, que afirma a liberdade de homens e mulheres maiores de idade contraírem matrimônio e fundarem uma família. Além dessas referências, há todo um artigo em que essa questão é ainda mais explícita, como na passagem abaixo:

“Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, isolada ou coletivamente, em público ou em particular.” (artigo XVIII)

Mas, se essa declaração foi tão amplamente apoiada pelos Estados saídos da II Guerra Mundial, a maneira como eles lidavam com os crentes e não crentes, e com as sociedades religiosas variava bastante. Em uns países, o Estado era confessional, isto é, havia religião oficial; em outros, o Estado era ateu, isto é, afirmava (e ensinava nas escolas) o caráter necessariamente alienado de toda e qualquer religião; outros, ainda, eram laicos.

Uma laicidade estrita foi inserida na Constituição brasileira de 1891, por força da ideologia das elites políticas republicanas, de orientação liberal, maçônica ou positivista, mas desprovida de base popular. A constituição de 1934 abriu uma nova fase, expressa na fórmula da “colaboração recíproca”, em moldes fascistas, que pretendia estancar a crise de hegemonia. Esse lema foi repetido nas Constituições posteriores, com pequenas mudanças formais, favorecendo aos dois lados da entente: as sociedades religiosas beneficiaram-se das entidades estatais para o exercício de sua atividade própria, enquanto o Estado recebeu um forte aliado na manutenção da ordem, com poucas exceções, localizadas e de curta duração.

Em 1988, apesar da evocação da proteção divina aos constituintes,como se todos eles fossem crentes, a liberdade de crença religiosa foi garantida em dois incisos do art. 5º.:

“É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção dos locais de culto e suas liturgias; (VI)

“Ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir prestação alternativa, fixada em lei.” (VIII)

Em suma, a Constituição brasileira assegura a liberdade de consciência e de crença, de organização religiosa e de culto, todas elas dimensões dos Direitos Humanos Fundamentais. Se essa foi uma importante conquista histórica, não é suficiente a ampliação desses direitos, que precisa mais do que isso carece da laicidade do Estado, de modo a não privilegiar uma religião em relação a outras, nem os crentes diante dos não crentes.

Em 2012, o Parecer nº 1 do Pleno do Conselho Nacional de Educação, institui as Diretrizes Nacionais para a Educação em Direitos Humanos, não como mais uma disciplina dos currículos, mas como tema transversal; e para todos, em todos os níveis e modalidades dos estabelecimentos de ensino públicos e privados; e tendo a laicidade como um dos princípios orientadores.

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