Nos últimos anos, nós, educadores e militantes pró-laicidade, fomos surpreendidos com o crescimento e o acirramento dos debates e da organização envolvendo o movimento Escola Sem Partido. A atuação deste segmento se estende ao Congresso Nacional, assembleias legislativas, câmaras municipais e se dá de forma especialmente preocupante nas redes sociais. A proposta consiste fundamentalmente em aprovar projetos de lei que visem coibir o que os seus autores chamam de processo de ideologização dentro da sala de aula. Uma das proposições apresentadas prevê até previsão de cadeia para docentes.
Seus defensores argumentam que existe doutrinação ocorrendo nas escolas e defendem o que chamam de neutralidade política. Para isso preveem punição para professores e interferência na grade curricular e em materiais didáticos das escolas. Além disso, os integrantes deste movimento são contrários à presença de temas como gênero e orientação sexual nas escolas. De acordo com o grupo, o professor, ao tratar destes temas, pode comprometer, precipitar ou direcionar o desenvolvimento da personalidade e da identidade sexual de seus alunos. O projeto investe contra o que define como “ideologia de gênero”.
A estratégia que este grupo vem utilizando é transformar suas propostas em lei ordinária. Com esse intuito, criaram uma minuta do Projeto de Lei – Programa Escola sem Partido, que serve de base para qualquer parlamentar que se disponha a apresentá-lo nas casas legislativas em qualquer instância da federação. Já existem vários PLs em tramitação no Congresso Nacional, nas Assembleias Legislativas estaduais e nas Câmaras Municipais. Nestes projetos se prevê ainda que o professor “não poderá fazer propagandas político-partidárias em sala de aula nem estimular seus alunos a participar de manifestações”. A justificativa é de que cabe aos pais ensinar seus filhos uma educação moral que esteja de acordo com suas próprias convicções. O Escola Sem Partido concebe o professor como “agenciador ideológico e partidário” e os alunos como “audiência cativa e vítimas passivas de agentes ideológicos”.
Existem diversos pontos controversos e extremamente graves defendidos por este grupo, dentre eles a noção, combatida pela educação crítica e progressista, de que estudantes são desprovidos de ideias, pensamentos próprios e que são por isso, conforme o projeto por eles defendido, “vítimas passivas”. Acreditamos que os estudantes não são folhas em branco às quais o professor preenche, mas sim agentes, seres pensantes, que interagem e refletem sobre os temas através da mediação dos professores.
A aprovação destes projetos pelo Brasil representam a censura no ato de educar através do discurso falacioso da neutralidade. O professor, como todos os demais seres sociais, é um agente político. Ele tem posição e base ideológica. Mas isso não o define como “doutrinador”. Ele fornece ferramentas intelectuais para o aluno desenvolver suas próprias bases ideológicas. Além disso, a neutralidade é uma posição, a de conservação do modelo vigente. É essa educação que queremos perpetuar? Excludente, desigual e acrítica ?
Outro ponto fundamental de mencionarmos é que os defensores do projeto desqualificam a escola como lugar de formação da cidadania, promoção de valores democráticos e respeito aos Direitos Humanos.
Neste sentido, a aprovação destes projetos para nós do Observatório da Laicidade na Educação – OLÉ, representa um atentado contra a legislação que rege a escola pública no Brasil. Cabe, portanto, aos cidadãos brasileiros, denunciar as estratégias e manobras que tentam desrespeitar à Constituição que define o Estado brasileiro como Democrático e Republicano. O “Projeto de Lei Escola Sem Partido” é, portanto, para nós, inconstitucional.
Diante desse cenário de total desrespeito em relação às regras constitucionais, o OLÉ chama a atenção para a ameaça que paira sobre a educação pública no país. Cabe a todos nós, educadores principalmente, pressionarmos os parlamentares de nossos municípios e estados no sentido de impedir a aprovação desses PL’s. Eles representam uma violação ao principio da educação democrática e laica que acreditamos e defendemos!